"Ele
pode dar o sustento do dia a dia, o sentido
para a vida ou equilibrar as jornadas. o trabalho
significa muitas coisas. E só você
pode saber qual o papel dele em sua existência.
Bruna Flores era aquele tipo de criança
que, desde pequena, sabia o que ia ser quando
crescesse. “Tinha o sonho de ser uma grande
repórter, correspondente internacional,
e explorar o mundo pela profissão”,
conta a gaúcha de 29 anos. Na hora do
vestibular, claro, entrou na faculdade de jornalismo.
E foi lá, entre uma aula e outra, que
Bruna percebeu que podia estar errada. “Quando
os professores falavam sobre a rotina profissional,
que seríamos ‘jornalistas 24 horas’,
eu desconfiava que, no fundo, não era
bem isso que eu queria”, diz. Depois de
formada, vivia uma rotina sem horários
fixos, com salário baixo e sem um plano
de carreira. Teve a certeza de que o jornalismo
não era a profissão que tanto
queria. Na época, com casamento marcado
e planos de ter filhos, ela desejava um trabalho
que lhe desse estabilidade para viver o dia
a dia em família. “Fui amadurecendo
e percebi que meu sonho de vida era mais prático:
uma boa casa, alguém para dividir a vida
comigo, filhos e um salário que me garantisse
viver bem”, diz.
Foi assim que, em 2006, dois anos depois de
formada em jornalismo, Bruna tornou-se não
uma apresentadora de sucesso, mas uma funcionária
pública, caixa de um banco. Para ela,
isso significou uma vida tranquila perto do
marido e dos filhos. “Descobri que existe
vida fora da profissão. Que eu posso
trabalhar seis horas do dia e aproveitar as
outras dezoito para mim. Tive dois filhos, aprendi
a cozinhar, faço academia”, conta.
Trabalhar é viver
"Bruna
escolheu um serviço que lhe deu segurança
e paz para ficar com quem ama. Sua opção
mostra que não é preciso viver
para trabalhar, um problema generalizado hoje
em dia. “Precisamos rever a vida vivida
para o trabalho”, aponta Lívia
Moraes, professora de sociologia do trabalho
da Universidade Estadual Paulista (Unesp). “Vale
a pena batalhar tanto, chegar em casa exausto
e não poder aproveitar os frutos desse
esforço?”, pergunta. A questão,
que martela muitas cabeças, na verdade
é consequência da reflexão
fundamental: afinal, para que você trabalha?
Pelo dinheiro no fim do mês, é
claro. Mas não só. Trabalhar é
uma necessidade humana – com diferentes
significados em cada época da história.
Colher um alimento para comer ou construir uma
ferramenta de caça já eram trabalhos.
Por ter essa característica original
de uso de força física, na Antiguidade
gregos e romanos achavam ter emprego um ultraje
– tanto que a palavra trabalho vem do
latim tripalium, um instrumento de tortura.
A dignidade estava em se libertar do peso da
sobrevivência para se dedicar a questões
elevadas, como atividades intelectuais. Trabalhar,
na época, era coisa para escravos.
A Reforma Protestante, no século 16,
mudou um pouco essa perspectiva. A visão
religiosa encontrava no trabalho um modo de
cansar o corpo, que, assim, ficava sem tempo
para tentações – vem daí
a ideia de que o trabalho dignifica o homem.
Mas foi só a Revolução
Industrial, tempos depois, que começou
a dar ao nosso dia a dia profissional sua atual
característica positiva. O capitalismo
mostrou que, por meio de atividades remuneradas,
podemos conquistar coisas e nos destacar entre
as pessoas. Para completar, o fim do século
20 chegou dizendo que esse mesmo trabalho que
nos oferece poder de consumo também deveria
trazer felicidade. Afinal, se vamos nos dedicar
tanto a uma ocupação, é
justo que busquemos nela uma motivação
mais afetiva – ou seja, um propósito
maior que só pagar contas.
Esse sentido, que vem fazendo muita gente repensar
sua relação com o ofício,
pode ser ter mais tempo para a família
– como aconteceu com a Bruna. Como pode
ser usar um talento naquilo que se ama fazer,
construir algo que se torne um legado... Qualquer
que seja o propósito, o trabalho deixou
de ser apenas uma função prática
para tornar-se parte do sentido que damos à
própria vida – ou, ao menos, é
isso que estamos buscando. Não significa
trabalhar menos. Apenas que os sacrifícios
e problemas são diminuídos diante
da perspectiva de encontrar, na labuta de todos
os dias, a nossa realização. "
Trabalhar também é amar o que
se faz. Dedicar-se e ver sentido na profissão
é muito importante para boas realizações.
"Para
encontrar a satisfação profissional
é preciso saber o que nos dá prazer"
Trabalhar
é escolher.
"Encontrar
a satisfação a partir do trabalho
depende de autoconhecimento, de saber o que
te dá prazer”, afirma a professora
Yvette Piha Lehman, do departamento de psicologia
social e do trabalho da Universidade de São
Paulo (USP).
Para a especialista, trabalhar é o eixo
que nos dá autonomia. Porém, nossa
relação com o trabalho jamais
será satisfatória enquanto não
encontrarmos um sentido para realizá-lo.
A novidade é que, hoje, podemos escolher
qual será esse significado. Trabalhar
pode ter sentidos tão diferentes quanto
ser a atividade que nos oferece recursos materiais,
que define a identidade ou que nos traz felicidade,
entre muitas outras opções. E
se, há poucos anos, esse serviço
era como um casamento, mantido por toda a vida,
agora vivemos mais tempo, com mais saúde,
e ganhamos a alternativa de não manter
esse compromisso para sempre. Temos a liberdade
de fazer várias escolhas profissionais,
que tenham a ver conosco durante as etapas da
vida.
Trabalhar é ter equilíbrio em
todas os aspectos de nossa vida e as escolhas
podem nos dar este equilíbrio.
“Se há uma felicidade possível
no trabalho, ela depende de que essa atividade
seja a fonte de satisfação, e
não um mero meio para obter recursos
para satisfações posteriores”,
afirma Adriano Correia, diretor da Faculdade
de Filosofia da Universidade Federal de Goiás.
O trabalho se torna então uma fonte de
realização pessoal dando prazer,
equilíbrio e felicidade para cada um
de nós. Pois, como diz a música,"
a gente não quer só trabalho ..."
Texto: compacto do texto de Jéssica Martineli
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